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LESÃO MEDULAR E PARAPLEGIA: CONTINÊNCIA URINÁRIA E OUTROS PROBLEMAS UROLÓGICOS

A maioria das pessoas com lesão medular apresenta problemas no controle normal da bexiga. Isto pode manifestar-se através de incontinência urinária, dificuldade para urinar espontaneamente, infecções urinárias ou formação de pedras na bexiga. Em casos graves, sem apropriado tratamento urológico, os problemas da bexiga e as infecções podem levar ao comprometimento dos rins.

CONTROLE NORMAL DA MICÇÃO:

Em condições normais, o controle urinário depende principalmente do adequado funcionamento da bexiga e do esfíncter. A bexiga precisa ter um tamanho adequado, de forma a permitir intervalos de algumas horas entre as micções. Além disso, ela deve permanecer em repouso durante o período em que está enchendo. A sensibilidade vesical também é importante, sinalizando o enchimento progressivo da bexiga. O esfíncter, por sua vez, deve permanecer fechado, funcionando de forma semelhante a uma torneira fechada e impedindo o escape involuntário de urina. No momento de urinar, ocorre praticamente o inverso disto: a bexiga precisa contrair e elevar a pressão no seu interior, empurrando a urina em direção à uretra. O músculo da bexiga é chamado detrusor. O esfíncter deve agora relaxar, permitindo o livre escoamento da urina através da uretra. Para que estas ações normais ocorram, os nervos que chegam à bexiga e ao esfíncter e que partem destes órgãos em direção ao sistema nervoso central precisam estar intactos.

COMO A LESÃO MEDULAR AFETA O SISTEMA URINÁRIO:

sistema urinário: Em diferentes níveis da medula espinhal estão localizados centros que possuem grande importância na coordenação dos eventos relacionados ao controle urinário. Além disso, por ela passam vias nervosas trazendo informações do cérebro para a bexiga e desta para diferentes centros cerebrais. Após a lesão medular, estas estruturas podem ser afetadas. Dependendo de quais estruturas foram lesadas e da gravidade da lesão (lesões completas versus incompletas), diferentes distúrbios no controle normal da micção podem ocorrer. Como a inervação genital e intestinal apresenta muitas vias comuns ou localizadas proximamente às vias nervosas do sistema urinário, é muito comum a ocorrência de problemas sexuais e intestinais em pessoas com lesão medular. Um centro muito importante na medula é denominado centro da micção, localizado no nível sacral da medula. Este centro envia ordens para a contração vesical e em condições normais está sob controle voluntário. As lesões medulares neste nível geralmente comprometem a capacidade de contrair a bexiga. A queixa mais comum nestas circunstâncias é a dificuldade ou incapacidade para urinar espontaneamente. Por outro lado, nas lesões localizadas acima deste nível (lesões em nível torácico ou cervical), o problema mais frequente é a falta de controle sobre a contração vesical, devido à interrupção das vias nervosas originadas no cérebro. Com isto, a bexiga perde o controle voluntário e contrai de forma indesejada (hiperatividade detrusora), ocorrendo perda de urina. Por vezes, apesar da contração vesical forte, o jato de urina é muito fraco. Isto pode ocorrer devido à contração simultânea do esfíncter uretral. Qualquer que seja o nível da lesão medular, a sensibilidade vesical pode ser parcial ou totalmente afetada.

COMPLICAÇÕES UROLÓGICAS EM PACIENTES COM BEXIGA NEUROGÊNICA:

O termo “bexiga neurogênica” refere-se à falta de controle normal da bexiga devido a um problema do sistema nervoso. Nos pacientes com lesão medular, a invervação vesical (e esfincteriana) é geralmente afetada, levando à perda do controle vesical. Além dos sintomas de incontinência urinária, perda da sensibilidade vesical e dificuldade para urinar, os pacientes com bexiga neurogênica estão mais propensos a desenvolverem infecções urinárias, pedras na bexiga e nos rins e alterações da função renal.

AVALIAÇÃO DOS PACIENTES COM BEXIGA NEUROGÊNICA:

Pacientes com lesão medular e bexiga neurogênica devem ser avaliados periodicamente. Os objetivos são melhorar os sintomas urinários e a qualidade de vida, mas também prevenir a ocorrência de complicações como infecções urinárias graves, fibrose da bexiga, pedras nos rins e bexia e piora da função renal. Além da avaliação clínica, geralmente são necessários exames adicionais. Os exames de urina permitem avaliar a presença de infecções urinárias. Exames de sangue podem ser solicitados para avaliar a função renal e, em alguns casos de infecção, ajudam a determinar sua gravidade. Exames de imagem como ultra-som são rotineiramente solicitados para avaliar os rins e a bexiga. Por vezes, outros exames como uretrocistografia (que avalia a anatomia da uretra e da bexiga) e tomografia computadorizada do abdômen podem ser necessários. O exame urodinâmico é recomendado para a grande maioria das pessoas com bexiga neurogênica. Através deste exame é possível estabelecer como está o funcionamento da bexiga e do esfíncter. Estas informações podem ser fundamentais para a escolha das melhores alternativas de tratamento e também para identificar os pacientes mais graves, que precisam de exames e acompanhamento urológico mais frequentes.

TRATAMENTO DOS PACIENTES COM BEXIGA NEUROGÊNICA:

Existem inúmeras alternativas terapêuticas para pessoas com bexiga neurogênica. O tratamento deve sempre ser individualizado, levando em consideração os sintomas urinários, as alterações observadas nos exames realizados (notadamente a urodinâmica) e as preferências do paciente. Além disso, em alguns casos deve-se considerar também aspectos sociais e familiares. Por exemplo, um paciente com tetraplegia que não tenha assistência familiar ou de um cuidador frequentemente, deve receber um tratamento urológico que o torne independente do auxílio de outros.

Os tratamentos urológicos mais utilizados nos lesados medulares são mencionados a seguir:

TRATAMENTOS PARA PROMOVER O ESVAZIAMENTO DA BEXIGA:

Pacientes com lesão em qualquer nível da medula podem ter dificuldades para esvaziar a bexiga devido à incapacidade da bexiga contrair (principalmente aqueles com lesões em nível sacral) ou pelo espasmo/ contração do esfíncter uretral (principalmente nos casos de lesão torácica ou cervical).

Micções reflexas

Consiste em promover o esvaziamento espontâneo da bexiga, sem necessidade de sondas ou cateteres, através de manobras de estimulação/massagem sobre a bexiga. Estas manobras podem ser treinadas para melhores resultados. Nem todas as pessoas conseguem adequado esvaziamento com este método.

Cateterismo intermitente

Consiste em esvaziar a bexiga através da passagem de um cateter (ou sonda vesical) pela uretra. Após retirar toda a urina coletada na bexiga, o cateter é removido. Depois de algumas horas, repete-se o procedimento. Pacientes que tenham dificuldade de passar um cateter pela uretra (mulheres cadeirantes com espasmo dos membros inferiores e homens com estenose ou outros problemas de uretra) podem beneficiar-se de uma cirurgia para a criação de um pequeno tubo ligando a bexiga à pele do abdômen (utilizando tecidos do próprio paciente), de forma a fazer o cateterismo através deste tubo.

Tratamento farmacológico

Medicamentos da classe dos antagonistas de receptores alfa- adrenérgicos (doxazosina, tansulosina, alfuzosina e outros) podem ajudar a relaxar os músculos do colo vesical e do esfíncter uretral. Infelizmente, entretanto, sua eficácia é geralmente baixa.

Uripen ou coletor externo de urina

O uripen assemelha-se a um preservativo e é ajustado ao pênis da mesma maneira. Entretanto, sua extremidade está sempre aberta e conecta- se a uma bolsa coletora de urina, Assim, à medida que ocorrem perdas urinárias, todo o volume é coletado e não há necessidade de usar fraldas. Possui vários inconvenientes como a dificuldade de adaptação/colocação, altas taxas de infecções urinárias, frequentes lesões/ machucados na pele do pênis e o fato de sua presença impedir a prática de relações sexuais. Além disso, esta alternativa só deve ser considerada para pacientes cujas pressões vesicais sejam baixas e que não ofereçam riscos à função renal.

Toxina botulínica

A toxina botulínica (cuja apresentação mais conhecida é o Botox®) pode ser utilizada para relaxar o esfíncter uretral e melhorar o esvaziamento vesical. A aplicação é feita por via endoscópica, diretamente no esfíncter. Os efeitos duram por 3 a 6 meses, sendo necessárias reaplicações periódicas.

Esfincterotomia:

Consiste em realizar uma cirurgia por via endoscópica para cortar/ enfraquecer o esfíncter uretral. O objetivo é promover a saída mais fácil da urina, com baixas pressões na bexiga. Os pacientes passam a ficar totalmente incontinentes, necessitando de usar uripen (coletor externo) ou várias fraldas por dia.

TRATAMENTOS PARA AUMENTAR A CAPACIDADE DA BEXIGA E DIMINUIR SUAS CONTRAÇÕES INDESEJADAS:

Pacientes com lesão em qualquer nível da medula podem ter dificuldades para esvaziar a bexiga devido à incapacidade da bexiga contrair (principalmente aqueles com lesões em nível sacral) ou pelo espasmo/ contração do esfíncter uretral (principalmente nos casos de lesão torácica ou cervical).

Tratamento farmacológico

Vários medicamentos podem ser usados para melhorar o controle urinário. Os mais utilizados pertencem à classe dos anticolinérgicos, cuja função é diminuir as contrações indesejadas e involuntárias da bexiga. Esta ação pode não só diminuir as perdas de urina, como também reduzir as pressões na bexiga e diminuir o risco de problemas renais. Outros medicamentos podem ser utilizados isoladamente ou em associação com os anticolinérgicos.

Toxina botulínica

A toxina botulínica (cuja apresentação mais conhecida é o Botox®) tem sido utilizada com muito sucesso para tratar a incontinência urinária de pacientes com bexiga neurogênica nos quais a causa da incontinência urinária é a presença de contrações indesejadas/involuntárias da bexiga. Tipicamente, são os lesados medulares em níveis cervical ou torácico. A aplicação é feita por via endoscópica, em vários pontos da bexiga. Os efeitos duram por 6 a 12 meses, sendo necessárias reaplicações periódicas.

Cirurgias de ampliação vesical

Estas cirurgias vem sendo utilizadas há décadas em pessoas com bexiga neurogênica de tamanho muito reduzido ou nas quais as contrações vesicais involuntárias são muito severas e não respondem aos tratamentos conservadores. Baseiam- se no uso de um curto pedaço do próprio intestino do paciente, que é reconfigurado e incorporado à bexiga de forma a aumentar seu tamanho.

Neuromodulação e eletroestimulação

Tratamentos baseados no implante de eletrodos que ficam em contato com nervos da bexiga de forma a inibi-los ou ativá-los. Em alguns casos pode ser combinado com cirurgias para interromper a inervação vesical. Em pessoas com lesão medular estas formas de tratamento são realizadas em poucos centros no mundo, muitas vezes em caráter experimental.

TRATAMENTOS PARA AUMENTAR A RESISTÊNCIA URETRAL:

Alguns pacientes podem ter a função do esfíncter diminuída em virtude da perda da sua inervação normal. Com a perda da função esfincteriana pode ocorrer incontinência urinária. Tipicamente, as perdas ocorrem associadas a movimentos, esforços ou ao ficar em determinadas posições. Este tipo de problema esfincteriano ocorre predominantemente em pacientes com lesão lombar ou sacral.

Tratamento farmacológico

Tratamento farmacológico: Medicamentos com açao alfa-adrenérgica podem ser usados com o objetivo de aumentar a contração da musculatura do colo vesical e do esfíncter uretral. Sua eficácia, entreanto é baixa. Além disso, os riscos de efeitos colaterais são significativos, notadamente alterações cardiovasculares.

Injeção de substâncias de preenchimento

A injeção por via uretral de substâncias com capacidade de preenchimento pode promover o acolamento da parede uretral e reduzir as perdas urinárias.

Tratamentos cirúrgicos

Cirurgias para implante de um esfíncter artificial ou compressão da uretra através de uma faixa colocada sob a uretra (sling) podem promover significativa melhora da continência urinária.

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